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“Fama e Anonimato”: um livro de histórias e vida 

Por Isabel Gomes, Júlia Salvi, Luiz Octavio, Lucas Valença e Maria Clara Polcan 

Narrativas intrigantes que percorrem a vida de desconhecidos em Nova York, abrangendo desde indivíduos anônimos até um dos maiores cantores da história. Fama e Anonimato é uma compilação de textos jornalísticos escritos por Gay Talese durante a década de 1960. A obra se desdobra em três séries de reportagens cativantes: “Nova York: a jornada de um serendipitoso”, “A ponte” e “Excursão ao interior”. 

Talese é um exímio contador de histórias de pessoas comuns. Na sua lista de personagens, surgem faxineiras e engraxadores de sapatos, trabalhadores dedicados a profissões fora do comum e indivíduos esquecidos. Nos cinco capítulos iniciais, o autor retrata a história dos entrevistados de forma leve e fluida. Além da sua preocupação de fazer uma apuração meticulosa, com muitos dados estatísticos, o jornalista faz sempre questão de mostrar o ponto de vista da pessoa retratada. 

Na segunda parte de Fama e Anonimato, Talese aborda a construção da Verrazzano-Narrows, ponte construída em 1964 que liga Staten Island até o Brooklyn. O autor perfila de maneira única os encarregados das obras, chamados de boomers. Coletando informações diversas como a recorrência de acidentes e mortes nas obras e a insatisfação dos moradores que tiveram que abandonar seus lares para a implementação da ponte, o jornalista recorre ao uso de linguagens específicas da engenharia para retratar os acontecimentos. A construção levou três anos para ser concluída e não passaram despercebidas de Talese detalhes construtivos nesse período, todos eles valorizados por sua escrita refinada. 

A terceira e última parte de Fama e Anonimato é composta por 11 perfis de celebridades dos anos 1960. Esses textos, muitos deles magistrais, foram escritos a partir de pesquisas intensas e contínuas, vivência diária com o perfilado, diversas entrevistas e observações cuidadosas por parte do autor.  A escrita de Talese é tão expressiva e cativante que é possível se sentir como um amigo próximo do jogador de beisebol Joe DiMaggio ou do pugilista Floyd Patterson.  

O jornalista que começou sua carreira no jornal New York Times é sagaz, daqueles que descobrem os segredos e as características de cada personagem apenas em conversas sem pressa. Foi nessa época também que o autor escreveu um dos textos mais emblemáticos e reverenciados da história do jornalismo: “Frank Sinatra está resfriado”, uma magnífica reportagem de 55 páginas, feita sem que Talese tenha entrevistado o famoso cantor. 

Gay Talese é um dos maiores jornalistas da história, além de precursor do novo jornalismo (new journalism, em inglês). Fama e Anonimato é um exemplo do bom jornalismo, aquele “raiz”, com pesquisa de campo e a arte de ouvir com atenção. O “olho no olho” é essencial, até porque tudo foi feito sem uso de gravadores, curiosidade que o próprio autor conta no apêndice “Como não entrevistar Frank Sinatra”. Gay Talese é sinônimo de boas histórias e deve ser leitura certa para todo jornalista. 

Fama e Anonimato. De Gay Talese. Companhia das Letras, 2004, 536 págs., 83 reais