A Luta, de Norman Mailer, vai muito além de um ringue
Publicada em 1975, a obra narra a icônica luta entre Muhammad Ali e George Foreman pelo título de campeão mundial dos pesos pesados permeada por contextos e tensões políticas da época
Por Danilo Yamada, Gabriel Noronha, Gabriel Simões e Enzo Ferreira
O livro A Luta, de Norman Mailer, é uma ótima narrativa dos elementos, personagens e contextos políticos e sociais que precederam a memorável luta de 1974 entre Muhammad Ali e George Foreman. Um dos relatos mais notáveis já escrito sobre eventos esportivos, a obra amplifica a história para abordar as tensões políticas da época.
A luta aconteceu no Zaire, atual República Democrática do Congo, quando Ali tentava recuperar o cinto de campeão que lhe foi tirado, quando em 1967 se recusou a se juntar ao Exército dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã e só pôde voltar a competir dois anos depois. Foreman, por sua vez, defendia seu título e uma invencibilidade de 40 lutas.
Mailer conseguiu explicitar quase todas as tensões e contextos que existiam em torno desse confronto histórico. Foreman era um patriota americano e cultuava esses valores. Vestia um shorts vermelho e quando vencia no ringue fazia questão de comemorar com uma bandeira dos EUA. Cassius Clay havia se convertido para o islamismo e mudado seu nome para Muhammad Ali. Não escondia que representava a valorização e resistência de seu povo negro contra a dominância branca.
O jornalista narra a história de uma forma inusitada. Ele se coloca como um personagem na história, acompanhando os personagens e narrando e analisando suas interações. Isso torna a escrita muito parcial. Ele não faz a menor cerimônia para esconder que está torcendo para Ali. Ele acompanha o lutador desde o final de sua preparação em Deer Lake, Pensilvânia, até o alojamento dele em Nsele. Preferia isso a se aproximar de Foreman, que estava hospedado no mesmo hotel que ele, o InterContinental. Em certos trechos, Mailer parece demonstrar falta de conhecimento sobre o invicto boxeador.
O nível de descrição das cenas em A Luta (publicado em 1975) impressiona. Ele constrói os personagens, suas ações e seus diálogos, de forma extensa e meticulosa. E também muito impressiva, imprimindo um ritmo sempre rápido à narrativa. Isso faz com que tanto os personagens principais da história, Ali e Foreman, tenham momentos cativantes no livro, quanto as várias aparições de personagens secundários, como os sparrings e os treinadores. E o que aumenta o valor deles são as falas das personagens, grandes diálogos e declarações icônicas. Na tradução do livro, algumas dessas frases foram deixadas na língua original para mostrar o valor delas, que na tradução poderiam ser amenizadas.
Por ser uma reportagem sobre a cobertura de uma disputa de boxe, A Luta traz muitas referências pouco comuns a quem não se interessa por esse esporte. Dependendo do conhecimento do leitor, pode haver uma confusão na leitura.
